sábado, 28 de agosto de 2010

A MALDADE ALHEIA

A paixão de cristo sempre mexeu muito com o meu emocional. Das vezes que assisti, em quase todas, chorei. Quando menino me perguntava como algumas pessoas podiam ser tão ruins a ponto de flagelar e depois pregar o filho de Deus numa cruz.

O tempo foi passando e a experiência foi mostrando que o mundo está cheio de atos de violência gratuita. Quem não se lembra do caso do índio Pataxó queimado vivo por jovens de classe média em Brasília? Outro caso que provocou grande indignação foi aquele ocorrido com o menino João Hélio, arrastado pelas ruas do Rio, preso ao cinto de segurança. Atrocidades são cometidas aqui e acolá e parece que isto nunca terá fim.

Um fato recente envolvendo o goleiro Bruno, do Flamengo, ganhou destaque na imprensa nacional e internacional. A história mais se assemelha a um filme de terror trash, tal qual o massacre da serra elétrica, já que partes da vítima teriam sido devoradas por cães.(A bíblia narra uma história em que a perversa rainha Jezabel é lançada aos cães – 1Reis, 21:23).

Muito se fala da maldade humana, atribuindo-a, amiúde, a um ser sobrenatural: o Diabo. Quase ninguém assume que seria capaz de praticar atos antissociais, até porque a maldade está fora de quem a comete...

Lembro-me que quando do lançamento do filme a Paixão de Cristo, de Mel Gibson, este foi tachado de antissemita, pois os acusadores de Jesus eram Judeus. Ora, neste caso, acho que Gibson está inocente, porquanto se limitou a filmar passagens registradas nos evangelhos.

Em verdade, não há povo bom ou mau, o que se vê são agrupamentos de pessoas em torno de uma ideologia. Os judeus já estiveram em posição desvantajosa, especialmente durante a 2ª Gerra Mundial quando foram vítimas do holocausto promovido pelo sanguinário ditador nazista Adolf Hitler. Na polônia ocupada, Hitler determinou a construção de um muro para segregar os filhos de Davi.

Atualmente, o Estado de Israel construiu também um muro para isolar os palestinos.

Os americanos destruíram duas cidades japonesas com a bomba atômica, devastando predominantemente a população civil. Londres foi bombardeada pelos alemães na segunda Guerra Mundial e na extinta Iuguslávia se verificou um genocídio, denominado de limpeza étnica.

Americanos, franceses, alemães, japoneses, chineses e tantos outros são atores nesse grande cenário que é o mundo. A polarização, tal qual a que existia na guerra fria, já não subsiste. À época, os EUA conseguiram divulgar e inculcar em muitas mentes o discurso de que eles eram os libertadores e representavam o bem, enquanto os países da cortina de ferro, liderados pela então União Soviética, representavam o mal e deviam ser contidos.

Com a dissolução da União Soviética e a queda do muro de Berlim essa ideologia restou superada e hoje quase ninguém considera os EUA guardião bondoso do mundo civilizado.

Tomas Hobbes, teórico do absolutismo, afirmava que as pessoas precisavam de um ente poderoso – o Estado -  para conter o querer individual, pois o homem, num hipotético estado de natureza, é ruim em essência.

Bondade e maldade são conceitos humanos e parecem ter nascido conosco. Será? Muitos gostam de falar da maldade humana, mas poucos procuram entender os seus mecanismos, sua etiologia.

Para aqueles que leram o livro de Michel Foucault, Vigiar e Punir, certamente se depararam com a descrição de uma execução de um parricida, chamado Damiens. O texto é forte e impressiona pela riqueza de detalhes. A condenação foi aplicada diante dos olhos do povo ali presente, como se estivessem num espetáculo de horrores.

Àquela época, não bastava a execução pura e simples, fazia-se necessário o suplício, o qual, além de castigar o apenado, tinha o condão de desestimular condutas criminosas.

Atos bondosos ou vis estão presentes em qualquer ser humano (A propósito, recomendo assistir o filme Crash, no limite, com direção de Paul Haggis). A mão que apunhala é a mesma que afaga.

Quem, em segredo, já não teve pensamentos homicidas em relação àqueles que lhe causaram algum dano ou lhes desagradaram? É claro que muitos nunca admitirão isso... Mas, fato é que esse tipo de pensamento é demasiadamente humano.

Você pode ficar a vida toda atribuindo a maldade ao diabo, mas saiba que isto só serve para justificar agressões e atos criminosos de outros, os quais podem, convenientemente, dizer estar possuídos e que não fariam isso em estado normal:

Prefiro pensar que fazer o bem é vantajoso a todos, porque nos preserva e viabiliza a coexistência pacífica. O caos decorrente de condutas sem limites é mau porque tem aptidão para aniquilar a vida humana.

Não estou a dizer que todos são sádicos. Não é isso. Mas que todos têm o potencial de ser aquele que desagrega e causa muito dano ao grupo.

Dessa forma, da próxima vez que pensar na maldade alheia, reflita por um momento e olhe para dentro de si mesmo, talvez, a partir de então, pare de odiar o malfeitor ou culpar a sociedade e o Estado pela corrupção do indivíduo. Oxalá perceba a importância da autocrítica e descubra que a origem de todo o mal está em cada um de nós.

Um grande abraço a todos e até a próxima

4 comentários:

  1. David, gostei muito do seu espaço, além de seus textos. Vou linka-lo em meu blog. Concordo com vc: é preciso uma enorme coragem para a liberdade, para a verdade. Foucault tem um texto lindo sobre o tema: coragem de verdade. Obrigada pelo comentário!

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  2. Olá, Renata.
    Gostei muito de seu blog e tenho lido suas postagens sempre que posso. A blogosfera tem me surpreendido positivamente pela qualidade das informações que podem ser ali obtidas. Para contornar o problema da enorme quantidade de informações, tenho procurado seguir o exemplo de Michel Serres, que uma vez disse, a propósito do universo do conhecimento hoje posto a nossa disposição, que devemos pinçar informações relevantes.
    Um grande abraço e obrigado pelo comentário.

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  3. Excelente texto, Davi! Somos mesmo essa mistura de sentimentos e desejos. O ser humano, desde que se sabe da sua existência, é bom e mau. O que me assusta é o fato das pessoas se deixarem manipular pela mídia que, de acordo com seus interesses, nos impõe o lado das coisas.

    No caso do bruno, por exemplo, é assustador pensar no que esse rapaz teve coragem de fazer, logo ele é o lado mau da história. Mas e os policiais que ouviram diversas vezes a denúncia de ameaça de morte da amante e nada fizeram? E o sistema que só faz alguma coisa depois que tal ameaça é cumprida, e a moça já morreu?

    E os juízes que deram regalias para os assassinos "de boa família" do índio Pataxó???

    Parece que, ao lembrar tudo isso, podemos entender que a humanidade realmente é má e está perdida. Mas ainda devemos acreditar que existe muitas pessoas boas, que fazem o contrário dessas barbaridades. Pessoas que lutam pela justiça, que emanam amor e solidariedade.

    Bjs e parabéns pelo seu espaço, que está cada vez mais bonito!

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  4. Infelizmente o sistema viabiliza esses tipos de atrocidades. Mas, assim como você, acredito que muitas pessoas escolhem fazer o que certo ou pelo menos aquilo que é positivo ao grupo ou não cause dano à coletividade.
    Um forte abraço e obrigado, Isabele.

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