segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

O Bem e o Mal em Perspectiva

Desde pequeninos somos ensinados sobre o bem e o mal. Normalmente, o mal é associado a coisas horripilantes, como um monstro dotado de dois chifres, faces vermelhas e línguas flamejantes.
De fato, a maldade é sempre personificada como aquele indivíduo de aspecto sombrio, feio. Enfim, o mal tem rosto e comportamento bem definidos, não é mesmo?
Agora vamos falar do bem, aquela figura cândida, angelical, de certo modo ingênua, afinal de contas como associar a bondade à astúcia?!
Há também aquele indivíduo altruísta, daí a noção de alteridade, cujo objetivo de vida se concentra na promoção do bem comum, ou melhor, do próximo.
Já há bastante tempo o homem convive com essas noções nas suas mais variadas faces e mesmo hoje, tendo atingido um grau de desenvolvimento bem maior relativamente há dois séculos atrás, ainda mantém nítida essa dicotomia.
Há quem diga que a maldade pode ser encontrada até mesmo entre os animais, outros afirmam que bem e mal são polarizações necessárias e se prestam, especialmente nos primeiros anos de vida dos seres humanos, a fixar-lhes parâmetros com os quais conduzirão suas vidas, servindo, nesse sentido, como instrumento de orientação comportamental.
Outros tantos, afiliados a correntes filosóficas, acreditam que tais concepções existam na justa medida da sua utilidade para manipulação do grande “rebanho” por parte dos que acumulam o poder. Desta forma, a moral estabeleceria regras cujos objetivos subjacentes seriam o de conservação do poder impedindo que os indivíduos cresçam individualmente e atinjam a plenitude de sua existência.
Afora as questões filosóficas e mesmo morais, não se pode negar que os arquétipos têm sua finalidade organizacional e de certa forma servem de elementos pacificadores da coletividade. Seria muito difícil a vida em sociedade se não houvesse uma nítida distinção do que é certo e errado, e fazendo propositadamente uma ponte, entre o bem e o mal, pois, conforme se ouve, o que é certo não é bom?
Acontece que as relações engendradas ao longo da existência dos seres humanos não se subsumem perfeitamente a um modelo pré-estabelecido, dado o seu caráter multifacetário. Nem sempre quem ostenta um sorriso angelical nos lábios representa uma referência de bondade, justiça.
O Problema está na forma em que o mundo é encarado. Não se duvida da utilidade da manutenção de valores mínimos para viabilização da co-existência, seria tolo, inclusive, afastá-los.
Como vivemos em sociedade, tudo deve ser avaliado com base nos efeitos que nossas ações tenham no seio da comunidade. Aqui considero as noções de bem e mal importantíssimas: o mal seria toda e qualquer conduta individual ou mesmo coletiva que venha a causar distúrbios na ordem social e mesmo em um pequeno agrupamento. No plano intra-subjetivo, o mal seria aquela ação cujo efeito se mostrasse, de imediato ou a longo prazo, nocivo a seu agente. Portanto, o conceito de mal deve ser avaliado em seu duplo aspecto: intra e inter subjetivo.
Afirmações, argumentos, por mais eloqüentes que se desenhem, afiguram-se inúteis ante o naturalístico efeito das ações. Que adianta o sujeito afirmar que teve as melhores intenções se causou tanto mal com o seu atuar, interferindo negativamente na esfera de outras pessoas.
Nesse diapasão, é imperativo concluir que o mal, assim como o bem, são conceitos sociais e só existem no contexto humano. Na natureza, parafraseando uma linda composição de Caetano, não há pecado nem perdão.
O bem apresenta-se, ainda, como tegumento da paz e equilíbrio nas relações intersubjetivas, refletindo por todo o tecido social. No plano individual, se perfaz como instrumento de tranqüilidade interior, equilíbrio emocional e senso de avaliação e oportunidades, em suma, um leme para o pleno desenvolvimento pessoal, cujos reflexos sociais pela via da repetição são, deveras, positivos.
Quem há de não aceitar, desculpem-me o clichê, que um exemplo positivo vale mais e é muito mais internalizado do que mil argumentos indefectivelmente articulados?
Uma postura muito conservadora ante esses conceitos, concebendo-os de forma rígida e fechada em nosso conjunto de valores, pode nos deixar desmuniciados e inábeis na resolução de questões mais complexas com desdobramentos que transbordam o pequeno circulo de relação intersubjetiva básica, ou seja, aquele de trato quotidiano, com o nosso vizinho, parente, grupo de alunos etc.
Há várias maneiras de se chegar a um objetivo: algumas com um custo emocional pequeno, outras, em que se tem de pagar um alto preço. Acredito que tranqüilidade emocional seja uma moeda de alto valor, devendo ser economizada e gasta com prudência.
Relativizar é humano. Com efeito, enquanto instrumento auxiliar na composição de conflitos deve ser usado com razoabilidade. Não há soluções prontas, fechadas, no comércio social. Há circunstâncias e, como disse o grande General Napoleão Bonaparte, as leis que governam as circunstâncias são revogadas por novas circunstâncias.
As noções de bem e mal, certo e errado são conceitos eminentemente sociais e, como tais, devem ser avaliados no contexto humano dentro de um juízo de razoabilidade, sempre se buscando a conciliação do interesse individual com o coletivo, procedimento necessário e facilitador da convivência em sociedade e mesmo de sua manutenção em níveis de civilidade suportáveis.

DAVID CIZINO BARACHO

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