quinta-feira, 1 de julho de 2010

BEM VINDOS AO DESERTO DO REAL

Estava almoçando com um amigo num restaurante que mantém televisões ligadas por toda a parte. Entre uma garfada e outra, percebi que estava sendo exibido o vídeo show, um programa que todos conhecem e cuja função é promover outras atrações da Rede Globo.
Muito inteligente por parte da emissora, diga-se de passagem, já que além dos pontos do IBOPE conseguidos naquele horário, ainda ajuda outras atrações a também alcançar índices de audiência e, desta forma, incrementar as receitas da emissora.

Na ocasião, mencionei ao amigo que outrora gostava de assistir tal programa e, de imediato, fiz um link com o filme Matrix, quando me lembrei de uma cena em que Neo, ao passar de carro em frente a um restaurante, já desconectado da matrix, diz à Trinity que costumava almoçar ali. Naquele instante, ele se dá conta de que tem lembranças de coisas que não existiram na realidade.

Matrix foi um dos filmes mais cerebrais a que assisti, tendo o mérito de aliar um ambiente hi-tech com várias correntes filosóficas. É claro que muita gente só prestou atenção às lutas entre Neo e os Inspetores, nos saltos mirabolantes e nos embates regados a artes marciais. Mas quem resolveu assistir pela segunda vez com atenção teve o privilégio de perceber o mundo de outro jeito.

Uma outra cena que muito me impressionou foi quando Morpheus mostrou a Neo como o mundo realmente era, momento em que disse: bem vindo ao deserto do real. Essa frase é impagável. Há um trecho, também, muito interessante em que ele diz a Neo que só tem a oferecer a este apenas a verdade.

Pegando carona na afirmação de Morpheus, arrisco dizer que a vida objetivamente considerada é árida. Pensem: nascemos, crescemos e morremos e assim caminha a humanidade há milhares de anos.

A realidade é aquilo que acreditamos ser verdade. Esta verdade não é absoluta e é fortemente influenciada por nossas experiências passadas. Tudo que gira a nossa volta parece real, mais será que de fato é? O Estado, por exemplo, este ente poderoso tem, deveras, poder, ou este é produto de um pacto coletivo  de renunciar as vontades individuais em prol de um ser maior, incumbido de nos proteger de nossos pares? Essa foi uma idéia propugnada por Tomas Hobbes ao justificar o absolutismo.

Até que ponto uma autoridade pública realmente tem poder? E se todos resolvessem não mais obedecer,  como seria? Acredito que o caos.

No filme se coloca a idéia de que muita gente não estava preparada para  encarar o mundo como ele  realmente era e que fariam de tudo para proteger o sistema da Matrix. Aliás, quem viu o filme sabe que  houve um traidor no grupo de Morpheus e Neo, que exigiu a sua recolocação na matrix, como condição para auxiliar as máquinas.

O poder é uma ilusão, assim com o mundo de computador gerado pela Matrix?

Vejam bem, não estou aqui a fomentar desobediência civil, mas tentando levar as pessoas a refletirem mais sobre o sistema em que vivem.

As regras são necessárias, não há como fugir delas. Mesmo fora da Matrix elas existiam. Portanto,  a questão principal não é aversão às normas e sim o aperfeiçoamento do homem, levando-o a vôos mais altos, na medida em que toma consciência de como as coisas funcionam, tornando-se senhor de seu próprio destino.

Jesus Cristo, o Super Homem de Nietzsche, a Alegoria da  Caverna de Platão, podem ser percebidos no filme. Lembrem-se de que Neo ressuscitou no final e, quando foi desconectado, perguntou a Morpheus porque seus olhos doiam tanto, obtendo a seguinte resposta: porque eles nunca foram usados. Já no segundo filme ele voou. 

Quando Neo começa a acreditar, consegue fazer coisas extraordinárias, tais como parar os projéteis atirados contra si pelos Inspetores, bem como se desviar deles.

Não sei se consegui despertar em vocês o interesse no filme, mas espero que, pelo menos, ao acordarem pela manhã reflitam sobre o papel que exercem na sociedade e sobre o poder que cada um tem de modificar o seu futuro.

Um grande abraço a todos e até a próxima.

 

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5 comentários:

  1. Rapaz, nem imaginava que aquele papo no almoço ia render tanto!

    Mas,concordo plenamente com o texto. E vou te dizer mais:

    Estava assistindo um programa sobre a 2ª Guerra Mundial.

    Este programa falava sobre a ascensão de Hitler.
    Contou sua trajetória desde a 1ª guerra, como um simples Cabo, passando a ativista do PT Alemão (ai meu Deus, seria o Lula uma reencarnação?!)até chegar ao topo, comandando poderosos Generais e todo o Exército Alemão,o que deu no que deu.

    Fiquei pensando... Por que diabos milhares de soldados alemães, inclusive Oficiais, se sujeitaram a obedecer, a ponto de auto-sacrifício, um homem que, além de não passar de um ex-Cabo, nem alemão era??

    Tudo bem cara, vc me convenceu. Vou assistir Matrix de novo sem ficar focado na Carrie-Anne.

    Abraços

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  2. Pois é bitcho, fiquei com aquela idéia na cabeça e resolvi por no papel, ou melhor, no blog e compartilhá-la com mais gente. Quanto à ascensão de Hitler, realmente foi muito impressionante. Existe um filme que aborda essa questão de forma bem leve. O personagem é um professor de história, que aos poucos vai fazendo com que seus alunos tenham um comportamento de alinhamento com a sua figura, bem à maneira do que se observou na sociedade alemã daquela época. Um filme que, realmente, tem a pretensão de explicar o fenômeno. Pena que eu não me recorde no momento o nome.
    Um grande abraço e obrigado pelo comentário.

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  3. Olá, Átila. Lembrei-me do nome do filme: "A Onda". O título em inglês é "The wave". Vale à pena assisti-lo. Aconselho-o a assistir a versão de 1981, exibida pela televisão americana. Existe, também, um remake de 2007, salvo engano, cuja produção é alemã. Ressalto que o filme foi baseado em fatos reais acontecidos na Califórnia, EUA. Ali você consegue entender como toda uma população se calou diante das atrocidades do Nazismo.
    Um grande abraço.

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  4. Hum... O papo do almoço só poderia ter acontecido entre os super-super da 2ª. rs rs
    Mas, falando sério agora, gostei dessa coisa de "olhos que nunca foram usados". A partir do comentário do Átila, eu passo a pensar as coisas sob dois ângulos diferentes: muitas vezes a nossa dor provem de coisas que não conseguimos compreender, nossa visão é tão limitada que qualquer coisa que "saia do normal" (muitas aspas) nos agride profundamente. Por outro lado, só mesmo a nossa cegueira para nos fazer pactuar com tantas coisas exdrúxulas que nos cercam, e aí eu incluo não só o poder político.
    Acho q era só isso que eu queria escrever.
    Abraços pr'ocês.

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  5. O filme Matrix é muito interessante porque coloca várias questões de forma lúdica. A película é permeada de alusões a concepções filosóficas, de sócrates a Nietzsche. Faz referência, também, ao Cristianismo. Recomendo. Quanto à dor vir da não compreensão dos fenômenos, penso que, de certo modo, isso acontece. Tememos o desconhecido e a forma como o encaramos faz muita diferença e é fortemente influenciada por nossas experiências pretéritas. Nos libertar do julgo do medo não é fácil, mas possível.
    Obrigado Lú pelo comentário e um grande abraço.

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